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Artigo 225, CF:

"Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações"

 

"Posse" Responsável:

responsável sim, mas posse?

 

por Renata de Freitas Martins

Jurídico Associação Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos

 

Introdução

 

No início deste ano tive a honra em ser convidada para compor banca avaliadora de monografia de conclusão de curso de uma futura bacharel em Direito, cujo tema abordado fora "a proteção jurídica dos animais domésticos e sua posse responsável".

 

Citado tema fez renascer em mim vontade de abordar o tema do presente artigo, o qual tem sido uma constante em minhas habituais conjecturas há algum tempo, porém ainda não havia externado tal idéia de forma um pouco mais embasada e consistente, o que tratarei de fazer a seguir, já que o termo "posse responsável" parece ser praticamente uma unanimidade e utilizado rotineiramente por quase toda a proteção animal, inclusive no bojo de leis. 

 

Finalmente, importante de se ressaltar desde já que trataremos exclusivamente da questão de animais domésticos, já que a manutenção de animais silvestres (nativos ou exóticos) em casa, mesmo que "legalizados", não condiz com prática que eu possa aceitar como digna ou de afeto com o animal.

 

Fauna: definição e classificação


Para que falemos sobre os animais domésticos é de suma importância que saibamos primeiramente o que é a fauna, bem como sua classificação.

Segundo o evolucionista Ernst Mayr,  fauna, em estrito senso, is the totality of species in the area [1], e em lato senso, the kinds of animals found in an area as a result of the history of the area and its present ecological conditions [2] [3].

A legislação brasileira classifica a fauna em relação ao seu meio e nas suas relações com os seres humanos em: silvestres (nativos, exóticos, migratórios), domésticos e domesticados.
 
Animais silvestres ou selvagens: são aqueles naturais de determinado país ou região, que vivem junto à natureza e dos meios que esta lhes faculta, pelo que independem do trabalho do homem.
 
Animais nativos: são aqueles que têm, num determinado território, o seu habitat.

Animais exóticos: são os originários de outras regiões que ingressaram no território dos animais nativos, legal ou ilegalmente, e que se aclimataram.
 
Animais migratórios: são aqueles que por um processo de migração- imigração e posterior emigração, que se repetem, apenas permanecem temporariamente no território brasileiro, onde muitas vezes se processa o acasalamento.

Animais domesticados: são aqueles animais selvagens que, uma vez amestrados pelo homem, passam a conviver com este, sem apresentar as mesmas características de apego doméstico.

Animais domésticos: que são os que vivem nas habitações, nas cidades, no convívio humano, adaptados ao convívio familiar, e que, pelo seu apego ao ser humano, sua vivência fora do ambiente em que o homem vive, torna-se quase impossível a vida para ele.

 

Domesticação

A domesticação de animais é uma prática realizada desde os primórdios da humanidade, pois o homem sempre teve a necessidade de ter certos animais ao seu lado, seja para auxiliá-lo na caça de subsistência, ajudá-lo em certos serviços, ou apenas para fazer-lhe companhia. 

 

a) Cães

 

O termo canino tem sua origem etimológica nos canídeos selvagens, descendentes dos Miagis.
        

Apesar da origem incerta dos cães, os paleontólogos reconhecem o Cynodictis como antepassado do cão, sendo que na era geológica que surgiram muitos canídeos, com as mais diversas formas e variações de tamanhos, estimando-se que houvesse pelo menos 70 gêneros. Linneu denominou o cão doméstico como Canis familiaris, o qual pertence ao gênero Canis da família dos Canídeos.
        

Quanto à domesticação dos cães, estima-se que tenha se dado há pelo menos 15 ou 20 mil anos, havendo a probabilidade de ter sido o cão o primeiro animal a ter sido totalmente domesticado pelo homem.


b) Gatos

 

O gato surgiu há 50 milhões de anos, tendo como seus mais antigos ancestrais os Miacídeos, mas as primeiras referências têm origem no antigo Egito, Índia e Pérsia. Por meio da circulação dos comerciantes, o gato atingiu a Grécia e o Império Romano, e, posteriormente a Europa Ocidental com a conquista de Gália.

No Egito o gato foi enaltecido e honrado. Considerado como um animal santo, era mumificado e colocado em sarcófagos durante os funerais de famílias ricas. Nesta época, a gata transformou-se na representação da deusa Bastet, fêmea do Deus Sol Rá. Mais tarde os gregos e os romanos reconheceram seu valor como caçador de camundongos (?) e assim houve o início de sua expansão pelo mundo. Na Europa o gato se desenvolveu com as conquistas romanas. Foi admirado por sua beleza e dupla personalidade de selvagem independente e de animal doce a afável, e apreciado ainda mais no século XI quando o rato negro invadiu a Europa.

No século XIII desenvolveram-se as superstições e o gato passou de criatura adorada a infernal, associado aos cultos pagãos e feitiçaria. A igreja virou-lhe as costas e durante mais de 4 séculos foi sacrificado, enforcado ou torturado como herege. 

Novamente no século XVIII ouve-se novamente o canto dos louvores da beleza do gato. Ele está novamente em perfeito acordo com o espírito dos tempos. Poetas, pintores e escritores prestam homenagem à sua graça e a beleza de seus corpos. Balzac, Chateaubriand, Victor Hugo e Baudelaire consagram longas passagens ao gato e a seus gatos.

O gato doméstico pertence à mesma espécie dos gatos selvagens:

  • Europa: Felis silvestris;
  • África: Felis lyhica;
  • Índia: Felis ornata, sendo este o gênero conhecido mais próximo do gato doméstico.

Muitas foram as razões para que o gato cada vez mais fosse admirado, dentre as quais destacam-se:

- Seu físico, seus olhos, suas atitudes... o gato simboliza a beleza e a sedução;

- O gato personifica os fortes valores do novo século: independência, personalidade e naturalidade;

- O gato tem características naturais que o tornam um companheiro ideal.

Quanto à sua evolução do gato doméstico, há muita controvérsia, sendo que a teoria mais aceita é a de seu surgimento por meio do cruzamento entre o Felis sylvestris e o Felis lybica. Essa conclusão deu-se devido à domesticação inicial dos gatos no Egito, onde a maioria do grupo de 192 múmias de gatos preservados no Museu Britânico é de Felis lybica. (Loxton, Howard. Tudo sobre gatos- um guia mundial de 100 raças. São Paulo: Martins Fontes, 1982).

c) Silvestres:

Como definimos anteriormente, animais silvestres são aqueles que vivem junto à natureza e dos meios que este lhes faculta, pelo que independem do homem.

Pois bem. Com esta definição de animais silvestres fica latente que a domesticação destes é algo totalmente anti-natural, e, portanto, é considerada maus-tratos, já que para que esta existe, haverá que se retirar o animal de seu habitat natural, alterando-lhe toda uma estrutura de vida e costumes, podendo inclusive levar-lhes à morte.

Aliás, não apenas a retirada do animal de seu habitat que lhe trará malefícios, mas também, e, principalmente, os hábitos que o ser humano irá imputar-lhe, para que viva com essa nova "sociedade".

Devemos finalmente ressaltar que, animais silvestres, apesar de, em tese, terem sido domesticados, podem revoltar-se, e então, ninguém será capaz de pará-los. Temos exemplos recentes de acontecimentos fatais por causa desta insistência de alguns circos em manterem animais em seus números, como a morte do garoto Juninho em Pernambuco, que fora puxado para dentro da jaula de leões famintos e lhes servindo de refeição, após três dias de total jejum.

Assim, é inquestionável que lugar de animal silvestre é na natureza, seu habitat natural.

d) Outras Considerações:

Cães e gatos, sendo os principais animais domesticados pelo homem, dificilmente sobrevivem sem os cuidados humanos, já que criaram uma certa dependência.

 

Porém, existem outros animais que vivem muito bem sozinhos na natureza, mas que o homem insiste em tentar domesticá-los. É o caso das aves, os ferrets e a maioria dos animais colocados nos circos. Essa prática deve ser abolida, pois além de contrariar a natureza dos animais, ainda os submete a maus-tratos e é uma das principais causas e incentivos ao tráfico de animais silvestres.

 

"Posse" Responsável

 

Como citado no intróito do presente artigo, parece-me um pouco incoerente usarmos o termo POSSE quando nos referimos aos pets, já que tanto clamamos por  seus direitos, porém, quando nos referimos à relação entre eles e nós, dizemos que somos seus donos, que temos posse sobre eles e que são nossos. Será que não se trata de uma grande incongruência a utilização da tais termos tão antropocêntricos? Vejamos.

 

Segundo o direito civil, posse é a relação de fato estabelecida entre a pessoa e a coisa para fim de sua utilização econômica (Ihering). Tal instituto é albergado em nosso Código Civil exatamente no capítulo concernente ao Direito das Coisas.

 

Pois bem. Falarmos em posse sobre animais é o mesmo que admitirmos que animais são coisas/objetos, retrocedendo ao que o antigo código civil trazia em seu bojo (res nullius), e, portanto, quando falamos em "posse" de um animal, utilizamos denominação civilista e retrógrada, além de incoerente com tudo que grande parte da proteção animal diz defender.

 

Mas então, como devemos denominar a chamada "posse" responsável?

 

Se analisarmos nossa Constituição Federal com um olhar ecocêntrico e realmente acreditamos que os animais têm direitos, podemos buscar inspiração no próprio artigo ambiental (art. 225, CF) em nossa legislação magna, no qual temos que incumbe ao poder público e a toda a coletividade o dever de defender e preservar o ambiente, e especialmente no que concerne à fauna, incumbe-nos defendê-la. Portanto, cabe a todos a TUTELA da fauna.

 

Assim, muito mais coerente passarmos a adotar o termo TUTELA RESPONSÁVEL ao que rotineiramente vem sido denominado de posse.

 

E o que vem a ser a tutela responsável?  


Todos aqueles que possuem animais de estimação devem ficar atentos não somente aos seus direitos a ter estes animais, mas, principalmente, aos seus deveres em relação a estes animais, ou, caso prefira, ao direitos desses animais. A irresponsabilidade com animais domésticos também é um dos fatores que leva ao número crescente de animais nas ruas.

Assim, para que situações com estas aconteçam, algumas orientações devem ser seguidas para que a tutela responsável seja exercida. Vejamos:

  - uso de guia e coleira sempre que sair com o animal na rua;

  - recolher as fezes dos animais das vias públicas;

  - dar alimentação de boa qualidade e água fresca;

  - manter a vacinação contra raiva e outras doenças em dia;

  - manter a higiene dos animais, por meio de banhos periódicos;

  - propiciar lazer, passeios e brincadeiras ao animal;

  - realização do controle da população animal com a opção pela esterilização;

  - procurar um médico veterinário sempre que o animal estiver com alteração de comportamento ou sinais de doença;

  - não permitir que o animal acasale indiscriminadamente etc.

 

Conclusão

 

Por todo o exposto, mister concluirmos que, devemos atentar para a correta utilização de nosso vernáculo nas mais diversas situações, fazendo com que não hajam incongruências entre discurso e prática.

 

Além disso, o principal: que realmente divulguemos e pratiquemos a verdadeira tutela  responsável, evitando-se que milhões de animais sadios sejam anualmente simplesmente exterminados, prática esta inaceitável, anti-ética e mais incoerente ainda do que o erro terminológico que abordamos no presente artigo, e que muitas vezes também vem escondida sob os auspícios de mais um enorme erro terminológico: a tal da eutanásia humanitária (?).

 

SIM À TUTELA RESPONSÁVEL.

NÃO À MATANÇA DE ANIMAIS SADIOS.

 


[1] a totalidade de espécies na área.

 

[2] as espécies animais encontradas em uma área como resultado da história da área e suas condições ecológicas presentes.

 

[3] Evolution and Diversity. Selected essays of life. Harward University Press. England, p.563, apud Programa Ambiental: A Última Arca de Noé - www.aultimaarcadenoe.com

 

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