Sobre a ASERG  

 

  :: Missão

  :: Objetivos

  :: Diretoria

  :: Parceiros

   Nosso Trabalho 

  :: Histórias

  :: Atividades 

  :: Fotos

  :: Imprensa

  :: Boletim

  Animais e afins 

  :: Maus-tratos

  :: Links

   Fale Conosco 

  :: Cadastro

  :: Associe-se!

  :: E-mail

 

Artigo 225, CF:

"Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações"

 

Animais silvestres

podemos tê-los em casa?

 

por Renata de Freitas Martins

Jurídico Associação Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos

Introdução

Muito se tem falado atualmente na possibilidade de se considerar animais silvestres presentes em residências como pets. Mais ainda. Em matéria publicada recentemente em um portal da internet, pudemos ler declarações do IBAMA de que há brechas na lei permitindo que particulares sejam depositários fiéis de animais silvestres apreendidos do tráfico. Será que tais considerações merecem guarida? É o que analisaremos e concluiremos com este artigo.  

 

 

Animais silvestres: definição

 

Animais silvestres ou selvagens são aqueles naturais de determinado país ou região, que vivem junto à natureza e dos meios que este lhes faculta, pelo que independem do homem.

 

 

Mas e se o animal silvestre foi domesticado?

 

Pois bem. Com a definição de animais silvestres já exposta, fica latente que a domesticação destes é algo totalmente anti-natural, e, portanto, é considerada maus-tratos, já que para que esta existe, haverá que se retirar o animal de seu habitat natural, alterando-lhe toda uma estrutura de vida e costumes, podendo inclusive levar-lhe à morte.

 

Aliás, não apenas a retirada do animal de seu habitat que lhe trará malefícios, mas também, e, principalmente, os hábitos que o ser humano irá imputar-lhe, para que viva com essa nova "sociedade".

 

Exagero? Não! Um exemplo de um animal que muitos acham legal ter em casa, o papagaio. O que mais fazem com esses animais que acham ser pets? Alimentam filhotes e até adultos com leite, como se mamíferos fossem (por orientação do próprio “vendedor”, que tem interesse que o animal morra logo mesmo, assim poderá vender mais e mais), além de “aparar” as asas para não fugirem (velho e batido conceito de propriedade dos animais...). Ah... muita gente fica orgulhosa de dizer que o animal vive solto em casa (lógico, não pode mais voar...) e só vai para gaiola na hora de dormir (e quem disse que a hora de dormir do papagaio é a mesma de seu “dono” ?). Poderia citar muitos outros relatos ainda, mas escreveria páginas e mais páginas e nunca teria fim, tamanha as “proezas” cometidas contra os animais.

 

Devemos finalmente ressaltar que, animais silvestres, apesar de em tese terem sido domesticados, podem revoltar-se, podendo causar graves acidentes, além, é claro, das diversas zoonoses que podem transmitir.

 

Se o animal silvestre já nasceu em cativeiro pode, certo?

 

E será que para um animal nascer em cativeiro antes não foi necessário que exemplares de sua espécie fossem retiradas de seus habitats naturais?

 

Claro que sim. Portanto, incentivo ao nascimento de animais em cativeiro para venda é o mesmo que o incentivo ao tráfico.

 

Além disso, admitir-se aves, macacos e outros como pets é o mesmo que admitir com naturalidade que um ser humano inocente viva para o resto de sua vida em uma cela de prisão. Isso é natural?

 

 

E aquele animal que eu vi em péssimo estado sendo vendido na beira da estrada?

 

Comprar um animal por dó definitivamente não ajudará em nada.

 

Muito pelo contrário. Servirá de incentivo para que o criminoso disponha de novos animais para venda, já que é fácil fazê-lo. O ciclo infindável do tráfico sendo incentivado.

 

 

Ah, então se eu quero muito ter um animal silvestre, o certo é ir até o IBAMA e adotar um que tenha sido apreendido?

 

O IBAMA não pode e não deve repassar animais provenientes de alguma apreensão para um particular, pois isso seria o mesmo que legalizar o ilegal (“esquentar” animal de tráfico), ou seja, tira-se animais de um particular traficante e dá para outro que apenas receberá outra denominação legal – depositário fiel.

 

A afirmação do IBAMA que lemos dia destes em reportagem, de que há brecha na lei permitindo que qualquer pessoa “adote” um silvestre é simplesmente deplorável e falaciosa.

 

Aliás, basta uma breve citação do capítulo pertinente à destinação de animais apreendidos na lei de crimes ambientais para termos certeza da não existência de dúvidas em relação a essa questão, o qual reproduzimos o trecho que trata da questão a seguir:

 

CAPÍTULO III

 

DA APREENSÃO DO PRODUTO E DO INSTRUMENTO DE INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA OU DE CRIME

 

Art. 25. Verificada a infração, serão apreendidos seus produtos e instrumentos, lavrando-se os respectivos autos.

 

§ 1º Os animais serão libertados em seu habitat ou entregues a jardins zoológicos, fundações ou entidades assemelhadas, desde que fiquem sob a responsabilidade de técnicos habilitados.

 

(...)” (grifos nossos)

 

 

Entidades assemelhadas (sic) definitivamente não querem dizer pessoas físicas, certo?

 

 

Afinal de contas, quem pode receber animais provenientes de apreensões, então?

 

Tomarei a liberdade de reproduzir neste tópico parte de artigo já publicado nesta coluna no passado, tendo-se em vista que ainda existem muitas dúvidas a respeito, especialmente neste momento que o assunto tem estado de forma latente em pauta.

 

Infelizmente raros são os locais aptos para receberem animais provenientes de apreensões aqui no Brasil: alguns poucos Centros de Triagem (municipais ou estaduais); associações civis, devidamente registradas como criadouros conservacionistas ou mantenedouros da fauna exótica, as quais acabam assumindo um ônus estatal e sem qualquer ajuda governamental; às vezes um ou outro zoológico (lembrando-se que poucos são os zôos que estão legalizados perante o IBAMA), porém que acabam ficando com animais em seus setores extras, como excedentes; e alguns criadouros. 

 

Os Centros de Triagem, com pouca estrutura se compararmos à enorme demanda, normalmente recebem animais silvestres, especialmente papagaios, araras e aves em geral. Nos últimos tempos também passaram a receber alguns exóticos “da moda”: iguanas e tartarugas canadenses. Praticamente todos os dias tenta-se levar animais após apreensões para esses centros de triagem, porém o final é sempre o mesmo: não é possível fazê-lo. 

 

As associações civis, com raríssimas exceções, estão todas super lotadas também, e a enorme maioria abriga apenas animais domésticos, ficando aí uma enorme demanda excedente de animais silvestres nativos e exóticos. Vale ressaltar ainda que todas essas associações que abrigam e tutelam muitos animais passam por dificuldades financeiras enormes e surpreendentemente não recebem apoio governamental algum, apesar do trabalho extremamente necessário para o país. 

 

Já os zoológicos afirmam que os animais abandonados em centros urbanos atrapalham seus trabalhos, conforme veementemente discutido no IX Congresso Paulista de Zoológicos. É dito que não há a estrutura para receber todos os animais que se pretende encaminhar para os zôos. Reclamam muito também sobre os leões, pois há um alto custo para manutenção destes animais e os consideram como um problema (aliás, o caso dos leões excedentes no Brasil está tão gritante, que nosso próprio órgão ambiental tentou a manobra da “repatriação” (???) desses animais para a África há algum tempo atrás, havendo-se fortes indícios de que seriam levados para fazendas de caça). 

 

Finalmente os criadouros. Esta tem sido uma das opções de destinação de alguns animais silvestres aprendidos. Porém, tratam-se de criadouros comerciais, e que irão ter lucros com esses animais. Portanto, de se ressaltar que não entendemos albergados no artigo 25 da Lei de Crimes Ambientais os criadouros comerciais, tendo-se em vista que utilizarão, de uma forma ou de outra, um animal proveniente de crime para fins de comércio, ou seja, ganhando dinheiro com o crime da mesma maneira.

 

 

Mas então, diante das dificuldades para destinação,  o que se deve fazer com os animais apreendidos?

 

Se a falta de destinação para os animais é tão latente, o que se deve fazer então? Deixar de fazer fiscalizações e apreensões? Manter os animais obtidos e mantidos de forma ilegal com o próprio “dono” como depositário fiel? Colocar os animais para adoção a qualquer particular, desde que se ofereçam gaiolas maiores? Encaminhar todos os animais silvestres para os criadouros comerciais? Legalizar o ilegal sob os auspícios de nossos próprios órgãos fiscalizadores? E alguns grandes animais que ninguém quer (?), eutanásia? (a falaciosa humanitária, é claro...)

 

Realmente trata-se de uma questão ampla, porém, para que seja finalmente resolvida, não exige nada muito complexo. Isso mesmo. A solução é simples. Vejamos.

 

 

  1. Adequação de Zôos às reais necessidades do país

 

Mudança de função dos zôos, não utilizando animais como objetos de deleite visual humano, mas sim sendo um centro de recebimento, recuperação e tratamento de animais, atendendo assim a demanda de milhares de animais silvestres nativos e exóticos apreendidos, sendo meramente educacional e restrita a demanda de visitação, permitindo que os animais tenham uma recuperação e não fiquem jogados nos famigerados setores extras.

 

Concomitantemente, logicamente, a realização dos trabalhos conservacionistas e preservacionistas já realizados em alguns dos zôos.

 

Solução simples, útil e que daria um foco verdadeiramente educacional a zôos, atendendo à real demanda do país.

 

Já há em tramitação um projeto de lei neste sentindo, propondo-se que zôos transformem-se em centro de proteção à vida animal: PL 3192/2004.

 

 

  2. Educar, sempre educar!

 

Estímulo e prática da educação ambiental é outro necessário e urgente caminho. Mas o que é essa tal de educação ambiental, afinal de contas?

 

Educação Ambiental é o processo por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constróem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do ambiente, havendo, assim, a tão necessária inter-relação entre todas as formas de vida do planeta.  

Em termos jurídicos, vemos que no Brasil o parágrafo 1º, VI, do art. 225 da Constituição Federal determina ao Poder Público a promoção da educação ambiental em todos os níveis de ensino. Mas, apesar desta previsão constitucional, bem como o fato da educação ambiental já ser reconhecida mundialmente como ciência educacional e também recomendada pela UNESCO, pouco é feito no Brasil para a sua implantação concreta no ensino. O que existe é fruto dos esforços de alguns abnegados professores, educadores e associações, não havendo a atenção que merece o tema pelo poder público e redes de ensino.

Com a publicação da Lei 9.795/99 a questão tomou força, pois a implantação e aplicação da educação ambiental como disciplina passou a ser obrigatória.

Agora nos resta exigir de fato que se cumpra esse necessário caminho. Portanto, educadores, professores, alunos, associações e a sociedade como um todo devem estar conscientes da necessidade de uma implantação efetiva da educação ambiental como matéria no processo educacional moderno público e privado e exigir dos órgãos competentes a aplicação da citada legislação, bem como incentivar a educação ambiental não-formal (além da necessária continuidade do que já se existe, claro), pois só assim poderemos conseguir desenvolver uma sociedade sadia e coerente com os princípios básicos de preservação do meio ambiente e, conseqüentemente, veremos a demanda para destinação de animais decrescendo, como fruto da tão sonhada extinção do tráfico e não das espécies.

 

 

  3. Parcerias com associações

 

Parcerias com as associações que lidam de fato e na prática (não de dentro de escritórios e atrás da telinha fria de um computador) e conhecem bem a questão dos silvestres, mas têm que trabalhar a duras penas, sem incentivo algum do governo.

 

Essas associações, além de poderem contribuir com todo know how adquirido ao longo dos anos de seus trabalhos, também muitas vezes conhecem a situação muito de perto, sabendo exatamente quais as bases do problema, o que facilita, e muito, na busca por soluções e caminhos viáveis para a contribuição com o tão necessário fim do tráfico de animais.

 

Aliás, se órgãos oficias procuram uma associação constantemente, para depósito legal de animais, confiando no trabalho feito, porque será que o executivo omite-se? Transferir o “problema” sim, mas colaborar, não? Como todos sabemos, a tutela da fauna cabe ao poder público e a todos nós (artigo 225, caput, CF) e não apenas às associações.

 

 

  4. Combate ao tráfico em suas bases


Finalmente, trabalho de base para terminar com o tráfico em suas bases é extremamente necessário.

 

Como admitir que se espere termos milhares de animais vítimas do tráfico para então discutirmos a questão? Aliás, erro meu, porque a questão de fato pouco se discute. Discute-se apenas a conseqüência da questão e por uma simples razão: porque essa conseqüência começa a “perturbar” os olhos do Executivo e começa a adentrar seus escritórios. Animais e mais animais amontoados nas salas, implorando por cuidados, a ponto até de termos a inadmissível afirmação de que qualquer particular poderá adota-los. Fácil, não? O que incomoda, tira-se da frente de qualquer maneira. Ou será que algum inocente ainda pensou que essa adoção seria algo legal, que o órgão ambiental fiscalizaria o particular rotineiramente e exigiria condições dignas para o animal adotado? Come on!

 

Portanto, que se realize um trabalho preventivo, combatendo que o tráfico aconteça, e assim, evitando-se que milhares de vidas sejam aprisionadas e, conseqüentemente perdidas, porque animal silvestre em cativeiro é praticamente uma vida perdida.

 

E como fazer isso? Que se abram novos concursos e se dê condições de trabalho para fiscais. Tenho certeza que temos pessoas aos montes nessa Brasil que realizariam esse trabalho com todo o gosto, tendo orgulho de sua profissão (como de fato já temos muitos policiais e fiscais atuando, verdadeiros heróis, já que o Estado não lhes propicia o mínimo de condições necessárias, especialmente logísticas). Afinal, se deputados federais, por exemplo, podem contratar funcionários com belos salários para trabalharem (?) em mês que não se trabalha, se o governo pode gastar tanto com viagens e festinhas particulares no Torto, porque não pode oferecer trabalho para pessoas normais para o exercício de atividade salutar para a manutenção do que ainda resta da biodiversidade nacional, que nem sei se ainda posso chamar de uma das mais ricas do mundo?

 

 

Conclusão

 

Por todo o exposto, fica claro e notório que não se deve de maneira alguma ter ou incentivar que se tenha animais silvestres em casa. Silvestre não é pet!

 

Em relação ao tráfico e suas drásticas conseqüências, quais sejam, milhares de animais a serem destinados e muitos sem a mínima possibilidade de retorno à natureza, que se tenha vontade política de nossos legisladores e do Poder Executivo, regulamentando mais santuários no país, criando-se condições de trabalho, inclusive com destinação de verba do Fundo Nacional do Meio Ambiente para estes fins (que tenhamos tido notícia, nunca vimos fauna beneficiada por este fundo), o que possibilitaria apoio logístico para o recebimento de animais provenientes de apreensões e concomitantemente que se combata o problema em suas bases, com real e efetiva fiscalização e educação. Nada utópico não?

 

 

NADA DE JAULAS MAIORES.  

AOS INFELIZMENTE JÁ CONDENADOS: DIGNIDADE

E AO FUTURO: LIBERDADE, LIBERDADE, LIBERDADE!

 

anterior        Página Inicial          próxima